Sexta-feira, 3 de Junho de 2005

DITADURA, SEXO E IGREJA, SEGUNDO ANTÓNIO

cerejeira[1].jpg

7/1/1905:
Vistos de longe, parecemos uma procissão de corvos. As sotainas pretas seguem-se tristemente umas às outras. Alimentamo-nos da mocidade que há em nós.
Estamos proibidos de voar. Obedecemos. Geralmente portamo-nos bem e seguimos os caminhos que nos indicam.
Somos corvos espertos: todos sabemos algumas frases em latim e nenhum abrirá o bico para soltar o queijo ou para dizer o que realmente pensa.

7/5/1905:
Lembro-me de quando fui, com o António Duarte, espreitar a cela do David.
Manda-nos o regulamento dormir com as portas abertas, mas proíbe-nos de entrar em quartos alheios.
A bem dizer não desrespeitámos a regra, pois não passámos do corredor. Nada vimos: estava escuro como breu; ouvimos apenas uns gemidos estranhos. Pouco mais pudemos apurar porque sentimos os passos do Padre Director e nos escapámos a correr para as nossas camas.

12/5/1905:
Às vezes penso que não quero ser padre. Também não faço tenções de ser professor primário nem funcionário público. A verdade é que ainda não sei bem o que pretendo.

11/11/1911:
O combate político vai-nos irmanando. Sinto-me cada vez mais próximo do padre Manuel Cerejeira e vou fazendo outros amigos.

28/12/1928:
Chega ao fim um ano muito especial. O padre Manuel Cerejeira foi feito bispo, por decisão do Papa Pio XI. E eu, cá estou.
O Vaticano não dá ponto sem nó. A estadia de Mateo nos Grilos não foi fruto do acaso nem de um impulso momentâneo do Manuel.

22/12/1929:
O Manuel Cerejeira subiu. É agora Cardeal.
Eu tenho quarenta anos e, mais tarde ou mais cedo, serei primeiro-ministro.
Chego a imaginar que cada ser que nasce é contemplado aleatoriamente com bênçãos ou maldições. A nós, calhou-nos ser distinguidos entre os demais pela inteligência e pelo carácter.

29/8/1933:
Foi criada a Polícia de Vigilância e Defesa do Estado.

20/9/1951:
Falei verdade à francesinha, mas não disse a verdade toda.
A minha vida interior não se reduz a preocupações de ordem intelectual. Comporta frequentemente imagens mais profanas.
Imaginar Christine a despir-se, expondo progressivamente o seu corpo elegante e perfumado tornou-se uma das minhas fantasias.

28/12/1958:
Só me faltava esta! O bispo do Porto fez circular uma carta aberta em que critica o regime, em nome dos princípios cristãos.
Terá esquecido a Igreja tudo quanto me deve?
É a primeira vez que um dignitário da Igreja se ergue contra mim. Procurarei que seja a última. Seremos duros para com ele, e até implacáveis!

17/10/1962:
João XXIII escancarou as janelas do Vaticano às tempestades do mundo.
Lá para diante, há-de vir outro Papa que segure de novo as rédeas com firmeza e restabeleça os grandes princípios da Igreja. Eu já não verei isso.

4/6/1965:
Será que o Cerejeira nunca teve uma namorada?

14/12/1965:
Desconfio que o Manuel Cerejeira se masturbava diariamente no tempo dos “Grilos”. Pelo menos, fechava-se na casa de banho todos os fins de tarde e ficava lá mais de meia hora.

(de “O Diário de Salazar”, António Trabulo, Ed. Parceria A.M.Pereira)

















































publicado por João Tunes às 19:17
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